Sobre a polêmica de racismo no Oscar, a Viola Davis é sempre a mais esperta da sala



Eu queria escrever isso há alguns dias, mas preferi dar prioridade ao artigo sobre Steven Avery que publiquei ontem (leia AQUI), primeiro porque falar sobre racismo é bem polêmico e na verdade falar de tudo hoje em dia é polêmico, alguém vai se ofender com qualquer coisa que alguém disser, não importa o assunto, mas falar sobre racismo é facilitar isso.

A primeira coisa que eu queria dizer é que o Oscar não é racista. Apesar de toda a polêmica e dos boicotes que Will Smith e sua esposa, e outros atores prometeram, mesmo a recente vencedora do Oscar Lupita Nyong'o, eu continuo afirmando que o Oscar não é nem de perto racista. Como o Michael Cane disse, isso não é consertável, você não pode votar em um ator só porque ele é negro. A Academia disse que ia tomar medidas para rever isso, mas a menos que o Oscar aplique uma cota, o que seria terrível, ou categorias a parte, que seria segregação e retrocesso, não há absolutamente nada que o Oscar possa fazer sobre o assunto, a menos que nas cédulas que vão para os seus mais de 6000 votantes tenha uma frase lembrando sobre diversidade, o que não vai mudar em nada o caso.


Esse ano há uma injustiça especifica no Oscar que é o fato de Beast of no Nation e especialmente Idris Elba não estarem concorrendo como Melhor Filme e Melhor Ator Coadjuvante. O próprio Michael Cane, na mesma entrevista que disse que não pode votar em alguém simplesmente por ser negro, disse que é surpreendente o fato de Idris Elba não ter sido indicado, mas não por Idris Elba ser negro e sim por ele ter sido absolutamente fantástico no seu papel de Comandante. Entretanto eu acho que o problema com Beast of no Nation é com a Netflix e não racismo, afinal indústrias milionárias não são nem racistas, nem machistas, nem homofóbicas, indústrias milionárias são simplesmente capitalistas.

Se o problema não está no Oscar, onde ele está então? Porque afinal é indiscutível que existe um problema.

Como sempre, indo além de boicotes simplistas e das respostas mais fáceis, a atriz Viola Davis se mostrou mais uma vez a mais esperta na sala e falou por mim o que eu queria ter escrito há alguns dias.
O problema não está no Oscar, o problema está no sistema de se fazer filmes em Hollywood
De acordo com Viola, e ela está certíssima, o problema está no fato de que das centenas de filmes produzidos hoje em dia, pouquíssimos tem negros em papeis importantes, pouquíssimos tem negros em geral e de acordo com ela o problema não está nem na questão dos salários, enquanto as atrizes reclamam que ganham menos que homens, as atrizes negras deveriam reclamar que ganham menos que as atrizes que estão reclamando.

A conta é simples, se não há filmes com negros sendo produzidos, não há no que votar no Oscar. E sim, Beast of no Nation poderia ou não estar na lista, eu não sei bem a questão da Academia com a Netflix, mas é só UM filme, a injustiça com esse filme é a mesma injustiça com outros grandes filmes, com negros ou não, que ficaram de fora.

Se você quiser saber um pouco mais sobre Viola Davis e sobre sua luta, veja esse discurso que ela fez quando venceu o Emmy:



J.J. Abrams deu o primeiro passo para diversidade nos cinemas, ao colocar uma mulher, um negro e um... gay (talvez? Poe Dameron?) como personagens principais do maior filme dos últimos tempos. Com o sucesso absoluto de Star Wars : O Despertar da Força eu não tenho dúvidas de que Hollywood vai perceber que Will Smith não é o único ator negro que dá dinheiro e sinceramente, você acha que o que fala mais alto nessa indústria é a cor da pele e não é o dinheiro?

A demora foi grande, a luta continua, mas quando Hollywood notar que a diversidade também é rentável e que se você não dar apenas papeis estereotipados e "de gueto" para atores negros, você pode ganhar muita grana, essa situação certamente pode mudar. Imaginar que a quantidade papeis para negros e brancos será a mesma é utópico no momento, mas não subestimem o poder do que o seu dinheiro pode mudar comprando os ingressos de cinema certos.


Mas sabe do que mais? Os bonecos do Finn em Star Wars encalharam nas prateleiras enquanto os do Kylo Ren venderam como agua, tudo bem, os do Kylo Ren são bem mais estilosos e de repente as pessoas compraram mais de um para poder tacar fogo em um deles, graças ao que ele faz no filme, mas todos os bonecos de Star Wars venderam bem e os do Finn não. Fontes internas da Disney / Lucasfilm disseram que eles ficaram surpresos com a demanda de pessoas querendo comprar brinquedos da Rey e que eles subestimaram a vontade de meninos comprarem um boneco de uma personagem feminina, mas eles aparentemente superestimaram a vontade de comprar bonecos de personagens negros.

Quantos bonecos de personagens negros são feitos normalmente? Quantos personagens e action-figures negros você vê na Ri-Happy normalmente enquanto passeia no shopping? Esse ano teremos Capitão América 3: Guerra Civil com o Pantera Negra, um personagem negro mais proeminente que o Maquina de Combate e o Falcão dos filmes anteriores. Será que teremos bonecos dele? Ou melhor, será que os bonecos dele vão vender?

Então se quando a indústria e o mundo está tentando mudar, ainda que sejam apenas em pequenos, singelos e quase imperceptíveis passos na direção certa e você não vota a favor da mudança com a sua carteira, mas não hesita em gastar em tudo que mantém o status-quo, talvez você não deveria culpar só os outros pelo racismo remanescente no mundo, afinal, é muito fácil culpar uma grande e "malvada" indústria e esquecer que quem sustenta ela é você, e ela dá a você, o que você quer, o que você compra.
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