Assassin’s Creed: Syndicate e Anita Sarkeesian e o (anti?) feminismo polarizado


Eu odeio termos como coxinhas e reaças, eu odeio até “pedaladas fiscais” porque parece trabalho de desinformação embora isso seja quase um termo técnico hoje em dia, eu odeio esses termos porque eles fazem um desserviço a qualquer discussão, quando você chama alguém de coxinha (que deveria ser uma coisa boa, afinal é coxinha), você está automaticamente desqualificando a opinião dessa pessoa estabelecendo que essa pessoa se encaixa em uma base de preceitos que ela provavelmente não se encaixa, ainda que a opinião dela em determinado assunto tenda pra esse lado, o mesmo vale para o oposto.

Mas é impossível hoje em dia falar sobre feminismo e especialmente sobre Anita Sarkeesian sem usar alguns chavões igualmente repugnantes como SJW (Social Justice Warrior) ou White Knights, termos que se você já participou ou apenas testemunhou uma discussão na internet como é o meu caso, sabe o que significa.

Como vocês devem ter ouvido falar, a Ubisoft ano passado levantou polêmica com declarações de que Assassin’s Creed Unity não tinha uma personagem feminina jogável porque era difícil animar uma personagem feminina, uma justificativa que não é machista e que seria aceitável se ela não fosse uma completa besteira, mas ainda assim essa foi a declaração de um funcionário tirada de um contexto especifico e não representa exatamente a opinião da empresa, ainda assim essa é a internet em que vivemos, onde é cool se ofender e isso foi um prato cheio.

O caso das mulheres nos videogames é problemático, a forma como elas são tratadas é um absurdo que deve ser combativo, nós mencionamos um pouco isso em nosso podcast Ângulo Pop #004, onde nós falamos sobre feminismo num podcast meses atrás explorando um problema real e não uma rixa interna da internet com pessoas que assumidamente se doutrinaram a se ofender, caso estejam pensando duas vezes antes de escutar.

Para resumir um dos assuntos do podcast, todo esse caso foi bastante explorado no #gamergate e isso, como tudo, gerou duas vertentes muito polarizadas, o #gamergate foi um caso complexo, cheio de camadas que merece um post e um podcast só sobre ele, mas não é difícil pensar que as opiniões de homens e mulheres feministas se polarizaram fortemente antes ao comportamento repugnante de alguns gamers o que compreensivelmente também gerou os antifeministas, que é um pouco (só um pouco) diferente de machistas, com opiniões igualmente polarizadas. Mas de toda essa guerra um nome se destacou nos argumentos dos dois lados. Anita Sarkeesian.


Muitos idolatram Anita Sarkeesian como se ela fosse uma espécie de Jesus Cristo do feminismo, outros tantos a odeiam como se ela fosse o próprio demônio.

Eu confesso que não sei muito sobre Sarkeesian, eu propositalmente não pesquisei a fundo sobre ela  porque eu não preciso informar a vocês sobre a vida dela e não preciso saber sobre a vida dela, mas eu sei que ela pode ser definida como uma blogueira canadense/americana ou como o Wikipedia diz, ela é uma Public Speaker, ou seja, ela pelo menos faz algo que muita gente não consegue fazer… falar em público.

Ela é a fundadora do Feminist Frequency, um site e canal do Youtube voltado a gerar awareness sobre a situação de como as mulheres são representadas em diversas mídias pops, principalmente nos videogames. Quando ela lançou sua campanha no Kickstarter para montar uma webserie sobre o mesmo assunto ela recebeu diversas ameaças de morte e estupros nojentas proveniente de homens de comportamentos reprováveis e que deveriam estar presos e provavelmente estariam se a internet fosse um pouco mais regulada. Não importa se ela é uma “mentirosa patológica” ou uma “vítima profissional”, como muitos dizem seja lá porque, nada justifica essas ameaças e eles deveriam mesmo ser presos por isso e quem fez isso só provou que o trabalho dela tem uma razão para existir, mas ter uma razão de existe também não a deixa imune de ser criticada.




A nova questão da internet com Sarkeesian dessa vez é sobre o review dela de Assassin’s Creed: Syndicate, que você pode assistir no vídeo acima desse parágrafo, as opiniões sobre ela dos e das feministas e dos e das antifeministas conseguiram ser polarizadas até sobre a qualidade de seu review. Você não precisa procurar muito pelo termo “Assassin’s Creed: Syndicate e Anita Sarkeesian” para ver por aí opiniões absurdas dizendo que o review dela sobre o jogo é o pior review da história dos games enquanto tem gente dizendo que o review dela é incrível e revolucionário e perdoem-me, mas ambos os vocalistas dessas opiniões distintas me parecem igualmente idiotas.

O nosso review de Assassin’s Creed: Syndicate deve sair essa semana então eu não vou dizer sobre o que eu concordo e discordo dela, mas vale notar caso você não tenha visto o vídeo, que ela foca 90% do review para falar da caracterização de Evie Frye, primeira personagem feminina de um jogo principal da franquia, já que spin-offs já tiveram protagonistas femininas antes. Evie é de fato uma grande personagem, feita com muito esmero para agradar qualquer jogador e com cuidado ainda maior para não desagradar SJWs. Evie é forte, engraçada e inteligente como muitas outras personagens femininas dos games que muitos falham em notar, mas diferente da maioria, Evie não é sexualizada, de fato, ela é sub-sexualizada enquanto os homens do jogo ficam muito mais expostos nesse sentido e nesse contexto o vídeo de Sarkeesian foi bem elogioso para o game.

Para quem odiou o vídeo pelo foco dela nisso, bem, ela só faz isso, o que vocês esperavam? É como se você odiasse o Neil deGrasse Tyson por falar de Perdidos em Marte, mas se focar apenas na ciência e não na direção de arte ou nos ângulos de câmera. Agora sites como o The Verge e outros nacionais que eu não vou citar dizem que o mesmo review é fundamental, incrível, ótimo, importante e até revolucionário… e eu pergunto, sério mesmo? É só um review bem comum onde ela foca que o jogo é legal porque tem mulheres fortes, personagens transgênicos e outros? É tão genial assim falar que a Ubisoft fez um bom trabalho na diversidade, quando todos nós já sabemos disso? Eu acho que é mais fácil voltar esses elogios para a empresa não? Que tal dizer que o trabalho da Ubisoft em Syndicate foi incrível, ótimo, fundamental e importante, já que ele foi no fim das contas?

Até porque, como muitas feministas profissionais e na verdade qualquer pessoa cujo trabalho se foca apenas em um aspecto especifico de um trabalho especifico, o trabalho de Anita é tendencioso e tem um perigoso viés confirmatório, tudo para ela é problemático porque o trabalho dela é procurar isso e ela conseguiu não se agradar com o fato de que Jacob tem mais espaço do que Evie, quando para mim pelo menos parece o oposto, pelo menos até a metade do jogo. Ou ela reclama do excesso de personagens brancos numa franquia que teve Aveline e Connor como protagonistas e até Altair.

Um dos sites que amou o extremamente comum vídeo de Sarkeesian disse uma frase que me parece ter saído do teclado de um White Knight da internet afora, que diz que Anita é “conhecida por fazer críticas contundentes” e mais uma vez, sério?

Das várias não contundentes coisas que eu li de Sarkeesian me vem à cabeça o seu review de The Witcher 3: Wild Hunt, onde ela crítica Geralt por só expressar raiva e fúria, porque afinal são apenas “as emoções permitidas ao patriarcado”, sim, essa é mesmo uma frase completamente contundente, certo? Ainda que ela esteja errada não só sobre sei lá de onde ela tirou isso, mas está errada sobre o próprio Geralt também. Ainda sobre o game, Sarkeesian reclama que inimigos, geralmente homens imundos e claramente vilões chamam Ciri de “puta” uma ofensa baseada na “cultura patriarcal” e quando ofendem Geralt, eles o chamam de “aberração”, graças a seu estado e que conota uma ofensa em uma “cultura fantástica”. Bem… porque é muito machismo mesmo de um jogo mostrar que homens se comportam como seres repugnantes as vezes, afinal, quando é que esse tipo de coisa acontece? Que bom que no mundo perfeito uma coisa dessas jamais aconteceu, tipo com ela própria meses antes e aparentemente demonstrar a realidade, ainda que como uma coisa ruim num mundo obviamente complexo, racista e cruel, faz de The Witcher deplorável… e patriarcal.

Ah, mas não deixe-me esquecer sobre o sexo. Não importa que as mulheres de The Witcher sejam feiticeiras poderosíssimas que influenciem na política do mundo, que sejam complexas, liderem exércitos, sejam mocinhas e vilãs, de fato, a grande salvadora do mundo, a Jesus Cristo (pra valaer) de The Witcher, é uma mulher e ainda assim, a “contundente” Anita Sarkeesian diz que The Witcher é uma representação do patriarcado porque Geralt transa muito. Afinal, nós aprendemos com algumas feministas que mulheres não gostam de sexo e sexo é apenas para homens.


O fato das feiticeiras de The Witcher não poderem engravidar ou adoecer faz com que elas transem muito na série inteira, de livros ou de jogos e não só com Geralt, mas porque elas gostam de sexo, não apenas com homens se você se pergunta, algumas das feiticeiras do game são lésbicas e fazem sexo, sexo é bom e não entendo como ele pode ser demonizado.

Em resumo, as opiniões sobre tudo em que cerca o feminismo estão muito polarizadas nesse momento, muita gente odiou o fato de Evie ter muito espaço em Assassin’s Creed: Syndicate e essas pessoas são estúpidas, outras dizem que o jogo é o melhor jogo de todos os tempos apenas por esse motivo e são igualmente estúpidas. E eu não sou feminista, justamente por causa da polarização do grupo, ainda que eu concorde com a maioria dos ideais, eu não posso fazer parte de um grupo onde uma feminista diz que todos os homens deveriam arrancar seus pênis e outra diz que todos os homens são estupradores, sim, eu sei que essa gente é idiota e não deveria falar pelo grupo inteiro, mas sabe do que mais, elas falam.

Sarkeesian, seja lá qual for a sua história pessoal que fazem muitos a odiarem, ela não é um demônio, ela só não é muito boa no que faz, ao mesmo tempo que idolatrá-la em todas as boas ideias ou loucuras e tentar fazer parecer que ela é uma das grandes mentes por trás da nossa sociedade é uma diferente faceta do mesmo problema e faz um desserviço a uma causa que embora justa, já sofre com um dos maiores problemas da nossa sociedade e do nosso discurso, o viés confirmatório e a polarização de tudo.
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