Frank | Crítica

Frank traz todas as convenções estilísticas e narrativas da 'polpa' do cinema independente - ou seja, a parte mais acessível e tradicional dele -. Em outras palavras, o longa protagonizado por Michael Fassbender é um emaranhado de clichês modernos que se esconde nas sombras de um tipo de produção que existe precisamente para escapar deles. Mas isso não necessariamente quer dizer que Frank seja ruim. O contrário é mais verídico, na verdade. Frank pode não ser a mais audaciosa produção independente, mas é um filme bem-vindo num mundo tão reservado.


Jon (Domhall Gleeson) é um aspirante a músico absolutamente medíocre. A sua inspiração criativa vem através da força e do esforço e não por originalidade e talento orgânicos. Então, ele conhece um grupo musical - cujo gênero não cabe a mim tentar rotular - ecêntrico, composto por sujeitos genuínamente insanos e liderado por Frank (Fassbender), um enigmático homem que veste uma gigantesca cabeça artificial o tempo todo. Vale observar que o filme é baseado na história real de Chris Sievey.


A sequência introdutória oferece um sight da mente de Jon - cinema britânico e os seus créditos iniciais lindos -, porém em momento algum o espectador se interessa pela sua figura. A primeira aparição de Fassbender é mais do que o bastante para provar não apenas o seu talento, mas também a proposital ausência de carisma de Jon (que não deixa de ser muito bem encarnado por Gleeson), pois Frank e todo o resto do filme expiram uma criatividade que o 'protagonista' só sonha em alcançar.


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O enredo é ridiculamente simples, intimista e convencional – como previamente declarado no parágrafo inicial –. Porém, Frank, ainda que completamente tradicional – a clássica figura excêntrica com uma aparência distorcida e que pode ou não ser fruto da imaginação do protagonista –, é um grande personagem, um dos mais adoráveis que Fassbender já viveu.


Algumas ferramentas do roteiro, como o uso das mídias sociais – acompanhamos o crescimento dos perfis sociais de Jon desde o começo para sentirmos o impacto do seu salto de popularidade –. Mas também traz clichês que de modo algum se deveria ver no cinema independente, como personagens deixando a barba crescer apenas para indicar a passagem de tempo e a exaustão psicológica e outros que não são minimamente desenvolvidos (o casal estrangeiro).


O músculo mais poderoso de Frank – além do próprio personagem título e da performance de Fassbender – é, simplesmente, a sua trilha sonora. As músicas de Frank são, de fato, brilhantes. Puro surrealismo sonoro, transmitindo através de uma assimetria instrumental e uma voz abafada um arco-íris sensorial, que num instante guia o espectador até uma casinha aconchegante numa fazenda e no outro nos confins da galáxia.


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Se tivesse de convencer alguém a assistir Frank, possivelmente utilizaria como argumento o seu momento final. Quando Fassbender finalmente tem a oportunidade de utilizar o seu maior recurso – as expressões do seu rosto – e a sua genial voz e cria espontaneamente a melhor canção de todo o filme, “I Love You All”. Quando Frank mostra o que tem de melhor: o próprio Frank e o seu talento e criatividade, que fazem muita falta no mundo real.

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