Minha fútil tentativa de viver uma vida pacífica em Beholder


Eu tinha Beholder na minha wishlist do Steam, mas tinha interesse na estética dele e não em ramificação de escolhas ou mecânicas. Com o lançamento dele para Playstation 4 tive a oportunidade de pedir uma cópia dele e jogar. Acabei por me impressionar com ele e a diversidade de escolhas que o mesmo propõe e como cada inquilino dentro do prédio tem algo a oferecer.

Em Beholder, você vive numa nação totalitária e por meio de uma loteria você é atribuído a função de síndico do prédio. Síndico é a forma como você se apresenta a seus vizinhos já que na realidade o seu papel além de administrar o prédio é reportar todas as atividades suspeitas de seus ocupantes e reportar qualquer discrepância a “justiça” usando meios como: Bisbilhotar os apartamentos enquanto os moradores saíssem, instalar câmeras dentro deles ou iniciar uma conversa tendenciosa com eles.

Beholder se inicia como qualquer outro jogo que se preze a mostrar uma opressão governamental, com pessoas tristes e pressionadas pelas regras estabelecidas. Beholder apropria essa opressão visualmente usando de uma palheta de cores com variações de preto e marrom. Não há qualquer representação de cores fortes que evoque algum sentimento.

Em princípio começamos com a mecânica simples de observar os vizinhos e reportá los. Isso pelo menos nos primeiros 30 minutos de jogo. Após esse tempo as regras começam a se tornar cada vez mais imbecis como não poder usar gravatas azuis (Seguindo a paleta de cores do jogo). Em torno de uma hora eu havia tornado o governo como side-quest apenas para não ser punido e comecei a me focar em meus vizinhos e família. Todos estávamos pressionados com a forma como aquele lugar funcionava e por isso tentei ajudá-los, como por exemplo conseguindo recuperar os documentos de um vizinho para conseguir fazer com que ele fugisse para uma parte melhor do país enquanto reportei aos superiores do governo que o expulsei.

Em outro momento entrei numa situação que resolvi ajudar um certo médico que morava no apartamento a conseguir uma namorada, o que isso tem a ver com a temática do jogo? Tudo. Mesmo em situações extremas ainda nos vemos com desejos bobos e a busca de uma fagulha de felicidade por menor que seja. Conseguir ajudar alguém a ter esse desejo realizado é uma camaradagem que nos distancia pelo menos um pouco das nossas obrigações terríveis.




Nossa família também importa dentro do jogo. Temos filho e filha e uma esposa, todos tem suas necessidades e precisam de você como a figura forte da família a ajudá-las com isso. Nossa esposa quer fazer uma janta diferente para nós, mas precisa de uma outra panela e pede que você pergunte aos vizinhos se eles tem o item em questão, e vamos de porta em porta atrás dele como num dia a dia qualquer. Nosso filho odeia o trabalho nas minas e se esforça na faculdade, porém gosta de uma menina e precisa de dinheiro para sair com ela. Conseguimos o dinheiro e lhe damos todo o conselho de como agradá-la a fim e deixamos o ir com um sorriso no rosto. Temos também uma filha, a mais nova e então infantil que não vê os males daquele mundo ainda que por inocência e sua única requisição ao paí é que achemos sua boneca na casa. Achamos e proporcionamos a ela a infância que ela merece enquanto a ainda tem.

Talvez as relações sociais e momentos de distração bobos sejam o que nos permita viver, mesmo que em extremo estresse e pressão. Nesse ponto eu já havia abandonado completamente a missão de viajar os meus vizinhos e queremos apenas viver em certa harmonia em meio ao caos que rodeava o prédio, embora esses momentos de felicidade não poderiam durar para sempre.

BEHOLDER É SOBRE FAZER ESCOLHAS - ESCOLHAS QUE IMPORTAM!

Conforme o tempo passa dentro do jogo, novos métodos de repressão do governo são iniciados e as pessoas oprimidas começam a iniciar seu próprio método de revolução, utilizando como meios de violência e golpes para atingir a sua liberdade a um custo alto. Isso afeta as pessoas com que vivem conosco. Em certo momento pela minha falta de capacidade de conseguir dinheiro, já que a maioria vinha de relatar os vizinhos ao governo, me vi em uma situação em que minha filha estava doente e o hospital obviamente era de péssima qualidade em vista da administração pública. Por sorte nosso amigo médico a quem ajudamos conseguiu diagnosticar a doença de nossa filha e conseguir nos prescrever um remédio, porém o mesmo era caro demais para pagarmos. No desespero, eu como jogador comecei a vender itens para tentar chegar ao valor indicado, porém sem sucesso e nossa filha vem a falecer. Talvez se eu tivesse levado mais a mecânica do jogo em conta, conseguisse evitar isso, mas eu queria viver uma vida pacífica enquanto podia e isso teve um preço.


Com o tempo toda a minha família veio a dizimar e só restar eu. Meu filho foi morto em um confronto com a polícia e nossa esposa sem esperanças veio a tentar tirar a própria vida. Afundado em dívidas e nesse ponto todos os inquilinos já tinham ido embora, não tinha nenhuma forma de me distrair. Os novos inquilinos momentâneos que vieram a ficar no prédio, ajudei a da melhor forma que pude a fim de poder me opor a uma vida miserável e tentar ao menos ajudar outras pessoas antes do fim eminente.

Não demorou muito até que meu personagem fosse preso e eu pegasse um dos piores finais do jogo. Um final incompleto já que muitas quests falharam, mas foi o final que aceitei para mim, como o que pude fazer para ter criado laços que mesmo momentâneo me permitiram viver alguns dias de uma paz distorcida, mas que era melhor do que nada e que aquele talvez fosse o “melhor” fim para mim e minha família.

Ainda não joguei o conteúdo adicional "Blissful Sleep" e não sei se planejo ao menos voltar ao jogo por não ser tão fã da mecânica administrativa dele, mas consegui me sentir imerso dentro de uma sociedade distópica e fugir do problemas e me levar por coisas fúteis como procurar uma namorada para um amigo, como talvez o fizesse na vida real também.



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