House of Cards – 4° Temporada | Crítica

SPOILERS

Eu gostei provavelmente mais do que deveria das duas primeiras temporadas de House of Cards, enquanto muitos dizem que Breaking Bad é a melhor série já feita e geralmente eu tendo a concordar, sempre me surge a ideia de que House of Cards poderia ser melhor do que a série de Vince Gilligan, mas a terceira temporada dessa que já foi o principal programa da Netflix, foi tão ruim que foi um baque na qualidade geral da obra.

No terceiro ano, aparentemente cansados de não conseguirem criar um vilão a altura de Frank e Claire, a série decidiu colocar um contra o outro, o que simplesmente não funcionou, em partes porque o maior charme da série é a relação entre os dois e também porque os dois são inteligentes demais para fazer o que fizeram em prol do impasse de ambos surgir. Era como se a série, arbitrariamente, forçasse essas duas pessoas inteligentíssimas a cometerem atos estúpidos na tentativa de conseguir algum drama. Para minha preocupação o início da quarta temporada foi idêntico a terceira, Frank Underwood aparentemente se tornou mesmo um imbecil que só sabe gritar com os outros e Claire virou a menina mimada que apesar de ter um intelecto superior a muitos, não consegue se comunicar de forma alguma.

Para minha felicidade, contudo, esse foi apenas o início da temporada, talvez como se apenas quisessem não invalidar o ano anterior inteiro, pois logo no quarto (ou terceiro? A falta de nome nos episódios de House of Cards me confundem) episódio, temos um plot-twist interessante. Frank leva um tiro de Lucas Goodwin e Meechum morre para salvá-lo, não que Frank tenha saído ileso, ele foi gravemente ferido e fica à beira da morte.
É quase como se a quarta temporada de House of Cards contasse dois arcos diferentes, o primeiro é a continua disputa de Frank contra Heather Dunbar nas Primarias e a sua cada vez mais complicada relação com Claire, esse arco termina muito bem com essa quase morte de Frank. Esse incidente faz o casal de protagonistas se unirem mais uma vez, aparentemente é pra valer dessa vez. Esse arco em si traz algumas coisas interessantes, ele bota Claire como estrela do jogo político e mostra um pouco das suas habilidades e também deixa Frank preso com seus pecados em uma espécie de coma, onde tudo que ele vê são alucinações, geralmente com Zoe Barnes e Peter Russo as duas pessoas que ele assassinou e além disso ser interessante por mostrar uma tendência continua nessa temporada de trazer os pecados de Frank da primeira temporada de volta, ele é legal por ter participações de Kate Mara e Corey Stoll. Eles fazem falta a série.

Apesar dessas participações serem nostálgicas, e que a Zoe Barnes realmente faça muita falta na série, esse ano foi cheio de bons novos e recorrentes personagens. O “vilão” da terceira temporada, o presidente Russo Petrov, vivido por Lars Mikkelsen, o vilão do segundo ano, Raymond Tusk também faz uma ponta, os já recorrentes Jackie Sharp, Heather Dunbar, Cathy, Doug Stamper (cada vez mais assustador), Seth e praticamente todos os outros retornam. Dentre eles Tom Yates, que no terceiro ano eu fiquei em dúvida sobre a qualidade do personagem e essa dúvida permanece, pois enquanto ele cria alguns bons momentos e é interessante em determinado ponto, a inserção dele na série parece ser apenas mais uma carta pendente e mal inserida nesse castelo de cartas que Frank e Claire estão criando, ele parece estar lá apenas para ser uma fraqueza para o casal e também uma estranheza para o público geral que mal consegue entender a relação entre Frank, Claire e ele.

Entretanto os novos personagens que mais brilham no ano são os vilões da vez, o governador de Nova York e candidato a presidente; Will Conway, interpretado por Joel Kinnaman de The Killing. Os Conway, a família completa, com esposa e filhos fofos, são os maiores rivais de Frank até então e são o foco da segunda metade e do segundo arco dessa temporada. Will e Hannah (essa interpretada pela belíssima e ótima Dominique McElligott) Conway são o casal perfeito, divertidos, com ótimos filhos, ele é veterano de guerra e ela atualiza seu Instagram o dia inteiro. Ambos são adorados pelo público como os Underwood nunca serão, a única fraqueza de Will, como Frank diz, é ele não ser Democrata, ou ele "seria imparável", Will até rebate que a de Frank é ele não ser Republicano e é verdade. Interessante ver como ambos, embora completamente diferentes, não se importem com as ideologias políticas dos próprios partidos e estão nessa corrida apenas pela fome de poder. 

A segunda temporada, mostrando Frank lidando não apenas com os Conways, mas com a versão da série para o ISIS, chamada de ICO, é cheia de tensão e mostra o poder de Frank e Claire de resistirem a tudo, embora como uma analogia ao nome da série, tudo que eles construíram é tão frágil que é inevitável ver o final da temporada sem saber que não havia como isso ser evitado, a casa de cartas dos Underwood está desmoronando e não foi a política que deu o golpe final e sim o jornalismo, traçando mais um dos muitos paralelos com a primeira temporada.

O que nos leva ao episódio final, uma obra de arte a parte, onde Frank além de estar lidando com uma matéria que vai fazer com que seja exigido o seu impeachment na pior das hipóteses ou com sorte vai apenas fazê-lo perder a eleição, ele também está lidando com um sequestro de uma família por terroristas domésticos filiados ao ISIS ICO, onde as suas negociações falham parcialmente e isso leva a morte de uma pessoa em rede nacional. Com a matéria sobre sua jornada ao poder cheia de corrupção, chantagem e ameaça (mas sem as mortes inclusas) já no ar. 
Numa cena magistral, Claire e Frank ponderam juntos as suas derrotas, quando mais uma vez, erguido por ela, o presidente Underwood decide agir, pois “eles podem enfrentar qualquer coisa” e para enfrentar aquilo, eles causarão “o caos e o medo no mundo”.

Na terceira temporada, Tom Yates descreve belissimamente a relação de Frank e Claire até aquele ponto da história: 
E um dia, três décadas atrás, quando um Redneck de Gaffney se casou com uma rica debutante de Dallas, o eixo da terra se inclinou. Embora nem eles nem nós soubéssemos naquele momento. 
Com isso em mente, não é difícil enxergar a nova figura que a série quer passar desses dois personagens, especialmente naquele minuto final de arrepiar. Os dois são dois Deuses, devastando terras e destruindo vidas em seu caminho, como se nada fossem, além de formigas no caminho de seus objetivos.

Agora é esperar a 5° temporada e provavelmente última, pois apesar de ainda ter sobrado um gás e de nos ter deixado ansiosos com esse final magnifico, dificilmente House of Cards tem muito mais para onde ir, a menos que se reinvente completamente.



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