Dark Souls 3 | Crítica


A From Software com sua abordagem diferente e nada comercial acabou criando hoje uma das franquias mais importantes e até mesmo bastante popular no mudo dos games, Dark Souls é mais do que um grande jogo e uma grande franquia, Dark Souls é uma grande referência e um padrão de qualidade a se atingir hoje em termos de mecânica, ambientação e até no seu grau de dificuldade, temos dezenas de grandes jogos indies que citam a franquia como exemplo e alguns que não citam, mas sabemos que há a inspiração. Mesmo jogos triple a já começam a se espelhar no sucesso dessa saga mais e mais.

Com isso em mente Dark Souls 3 tinha uma grande missão, dar um final ou uma continuidade (sei lá o que a From Software quer dizer sobre possíveis novos títulos) para a franquia, a boa notícia é que por quase todas as medidas Dark Souls 3 conseguiu isso, o jogo não deixa a bola cair em nenhum momento. Contudo, ele tem alguns lances decepcionantes.

Vamos para a parte boa primeiro, que é a maior parte do jogo. Dark Souls 3 é tudo o que você espera em termos de ação, dificuldade e desafio, é provavelmente o mais difícil dos 4 games da franquia, Bloodborne incluso e vai te propor um desafio que em alguns momentos vai fazer você considerar a desistência, mas no fundo você sabe que não vai, você vai tentar mais uma vez e mais uma vez para poder experimentar novamente o sabor da vitória. Tente não gritar de alegria ao derrotar o Rei Sem Nome, é o meu desafio para você.

Em termos de mecânica Dark Souls ainda é uma maravilha, os controles são absolutamente fluídos e a forma como tudo funciona é perfeita, mas além das funcionalidades anteriores, nós temos pelo menos duas novas ideias geniais nesse jogo, a primeira é o MP. Sim, agora você tem uma barra de MP que faz muito mais sentido do que ter quantidade numeradas para magia, te permite repensar melhor em como ser um caster, especialmente porque você pode realocar seus frascos de estus, se você tem 5 frascos pode escolher usar 3 para encher o MP e 2 para HP, ou o contrário, ou todos para encher o HP e nada para MP caso você decida simplesmente não usar magia, enfim, você pode gerenciar isso da forma como você quiser. Entretanto, querendo ou não você vai acabar usando seu MP graças a segunda ideia genial do jogo, o Weapon Arts. Que são habilidades que todas as armas possuem e que te dão ainda mais a impressão de que você é um ser tão poderoso contra os bosses do game.

As Weapon Arts muitas vezes são inúteis no calor do momento, especialmente porque algumas são bastante lentas, mas isso te faz pensar em melhores estratégias sobre como usá-las. E ainda que algumas sejam inúteis na prática, na teoria ao menos elas são belíssimas e poderosas, um exemplo disso é a Weapon Art da arma do boss que é amplamente considerado o mais difícil do game e que eu mencionei acima. A habilidade é poderosíssima, bastante visual, mas bem lenta para ser executada contra bosses ou nos inimigos comuns que já estão te atacando, mas é uma forma bacana de se iniciar uma luta contra um inimigo um pouco distante, de preferência que esteja próximo a outros inimigos.

Por falar nisso, há muitos inimigos dificílimos no jogo, inimigos comuns como “os caras de olho vermelho que pulam para trás”, também os “monstrões crucificados”, as "velhas que diminuem sua barra de HP" e os “bichos com cabelo de tentáculos que sacodem a sua cabeça” (meu nome carinho para eles). Todos inimigos mais ferozes do que já se viu antes na franquia.

Eu sei que haverá alguém, algumas dessas pessoas com habilidades mágicas que conseguem finalizar o jogo sem sofrer um dano sequer dos bosses, o próprio Miyazaki disse que não acredita que essas pessoas consigam, mas eu realmente quero vê-las tentando fazer isso em Dark Souls 3. Os movimentos dos personagens, especialmente dos bosses são extraordinariamente fluidos e bastante complexos de se entender. Um boss fazer um movimento y em um momento não quer dizer que ele vai fazer o movimento x depois, ainda que há um minuto atrás ele tenha feito.

Para ser honesto o jogo perdeu a mão na dificuldade em alguns pontos ao nível de ficar risível. O exemplo disso são os baús, que são mímicos, você pode ter certeza, se tem cerca de 50 baús no game, saiba que pelo menos uns 42 são mímicos, chegou ao ponto em que quando vemos um baú nós não cogitamos a possibilidade de que pode ser algo de bom, um item valioso, nós o consideramos como inimigos. (A propósito, no lugar de usar os baús de DS2 que eram bem mais bonitos ou criarem um novo visual, a From Software voltou a usar o visual bem feio dos baús de DS1 por algum motivo.)

Algumas batalhas com bosses são incríveis e memoráveis, além do Rei sem Nome que eu já mencionei, posso mencionar a batalha contra o Pontífice Sulyvahn, contra Aldrich e contra os Príncipes Gêmeos como marcantes, nem todas por sua dificuldade, os Príncipes Gêmeos são bem fáceis até, mas são visualmente legais de qualquer forma. A batalha contra a Dançarina do Vale Boreal é igualmente incrível, porém nós já sabíamos como a batalha seria graças aos betas do jogo. Agora a batalha mais impressionante de todas certamente é contra o chefão final Alma das Cinzas, que eu não vou mencionar aqui nada sobre ela, exceto de que ela decepcionantemente é um pouco fácil, mas que é no geral bastante incrível tanto visualmente quanto em termos de trama e o que ela significa.

A história de Dark Souls 3 também é extraordinária, nós já sabemos que a missão principal é sempre básica e simples, mas a mitologia do mundo contada através da arquitetura e de descrições perdidas e itens adquiridos ainda é de nos deixar maravilhados. E eu não sei se eu estou um pouco mais inteirado em como a narrativa da série funciona, mas ela parece bem menos críptica dessa vez, ela não é direta e simples de ser consumida, mas certamente ela está um pouco mais acessível do que sempre foi. Há também muito mais NPCs interessantes e missões bacanas para se concluir do que em qualquer jogo antes e eu dou destaque as missões de Siegward de Cataria e Irina de Carin.

Agora o jogo não é perfeito. Talvez para quem quiser iniciar na franquia, DS3 seja um ponto extraordinário para fazê-lo, ou quem já gosta da franquia mais não a aproveite em nível hardcore tudo está bem também, entretanto eu como fã extremamente hardcore de Dark Souls não pude deixar de me sentir decepcionado com algumas escolhas do jogo.

Para começar Dark Soul 3 escolheu descartar diversas boas ideias de Dark Souls 2 e trazer de volta todas as ideias do jogo original, incluindo algumas ideias bizarras de Dark Souls 1, simplesmente porque no geral muitos fãs preferem o primeiro ao segundo. Ideias como respawns infinitos de DS1 voltaram, quando em DS2 os inimigos tinham 10 respawn e depois disso você conseguia mais respawns se utilizando de itens. Ideias como corpos de inimigos mortos com efeito ragdoll voltaram o que faz um jogo belíssimo e sólido parecer um jogo amador de quem acabou de aprender a usar Unity. Além disso, transformar todos os cenários em labirintos quase indecifráveis não é exatamente o que eu chamo de boa ideia.

Assim como em Dark Souls 1 e Bloodborne, todas as áreas convergem em si própria, o que não é exatamente um exemplo de arquitetura realista e de fato é bem irritante e te passa a impressão de que os cenários são bem limitados. Talvez como consequência disso, Dark Souls 3 é o único jogo da franquia que não nos deixa maravilhado com os seus cenários, já que o game parece mais preocupado em achar formas criativas de fazê-los convergir em si mesmos do que em fazê-los criativos de fato. Eu não quero dizer que os cenários estejam ruins, o jogo continua impressionante e com um estilo arquitetônico e uma direção de arte brilhantes, porém não te apresenta nada novo. A Muralhas de Lothric e o Assentamento de Mortos Vivos são idênticos a outros lugares tanto de DS1 e DS2. A Capital Profanada é idêntica ao cenário da Coroa do Rei Submerso. O cenário mais bonito do game talvez seja o famoso Vale Boreal, contudo, ele não é nada diferente de Eleum Loyce da DLC A Coroa do Rei de Marfim. Nem mesmo os NPCs são novos, eles ou são os NPCs de Dark Souls 1 em pessoa ou são copias deles.

Ainda assim isso tudo seria perdoável se o jogo não falhasse em outro ponto que certamente vai desagradar diversos jogadores hardcore, que é na variedade de armas e equipamentos. Enquanto em DS1 e especialmente no DS2 quando parávamos para jogar o PVP nós nos deparávamos com as mais loucas e variadas builds, mas propositalmente (Miyazaki disse que faria antes do jogo sair) esse game tem bem menos armas e bem menos variedade entre elas. Menos armaduras também, nem todos os bosses agora te dão suas armaduras após derrotados, você não pode fazer cosplay de Pontífice Sulyvahn, por exemplo, ou da parte humanoide de Aldrich, basicamente todo mundo está usando a armadura de cavaleiro renegado, porque além dela ser razoavelmente boa e leve, ela é uma das poucas que tem um visual legal. Se você sempre foi um personagem com uma build de Inteligência e Força usando a clássica e querida Moonlight Greatsword, pode esquecer, a Moonlight Greatsword não escala mais S em Inteligência, nem mesmo A, ela escala um mísero C. Se você fazia uma build de Dex e Fé a melhor arma que você vai conseguir no jogo é a arma do Rei sem Nome, ela escala míseros C em ambos, mas é o que você tem de melhor. Ou seja, todo mundo que tiver uma build Dex/Fé vai ter essa arma, todos com uma build Força/INT vai ter unicamente a Moonlight Greatsword como opção, ainda que ela não seja a sombra do que ela foi um dia. O jogo não apenas se livrou da variedade, mas limitou muito mesmo as coisas que você tem disponível.

O novo sistema de infusão de armas é interessantíssimo, provavelmente o melhor sistema de infusão já pensado para a franquia, mas como toda boa arma não pode sofrer infusão eu sequer o usei uma única vez. Armaduras também não podem mais ser reforçadas, o que é outro desperdício de uma boa mecânica, mas como eu falei, a maioria só está usando uma armadura mesmo, então não faz diferença.

Para resumir, Dark Souls 3 tem alguns problemas a nível hardcore, mas num nível geral, se você ama Dark Souls mais pelo seu estilo narrativo, dificuldade geral, beleza e direção de arte, esse jogo não fica devendo em nada e é um bom desfecho (ou sequência) para a franquia. Se você é um jogador hardcore que se importa com as belas mecânicas que o jogo tinha e a sua incrível variedade, você saberá que o jogo não é perfeito, mas ainda assim é um grande jogo que vale a pena ser jogado dezenas de vezes.
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