O Que Fazemos Nas Sombras | Crítica
O mockumentary é um gênero que rende sempre comédias hilárias quando entregue nas mãos de gente criativa. Gente de bom gosto, gente inventiva. E é o que Jemaine Clement e Taika Waititi são: cineastas curiosos e que gostam de experimentar. Ou seja, do melhor tipo. Ao menos é o que demonstram no engraçadíssimo O Que Fazemos Nas Sombras.
O longa - que, como já referenciado, simula um documentário - acompanha o cotidiano de três vampiros, Viago (Waititi), Deacon (Jonathan Brough) e Vladislav (Jemaine Clement), sem contar com Petyr, um descendente direto do clássico Nosferatu. O trio divide uma casa e está tendo dificuldades para se adaptar à vida moderna e mundana e as suas banais responsabilidades e deveres, como pagar o aluguel, lavar a louça e entrar em discotecas.
Os três imortais são igualmente cômicos. Construídos como criaturas milenares sem a menor noção de certo/errado ou prático/estúpido. Quando questionados sobre a sua preferência por virgens, Deacon diz que atacam os 'puros' por 'soar legal', enquanto Vladislav defende que 'se você vai comer um sanduíche, você apreciaria mais ele se soubesse que ninguém o fodeu'.
Que também abusam dos seus poderes vampirísticos no dia-a-dia. Vladislav, por exemplo, arrasta o corpo das suas vítimas e assume estar ao mesmo tempo passando o pano no chão. Ou então as duas pequenas gêmeas, que se alimentam de pedófilos ingênuos. E por falar nisto, todo o círculo social em torno das figuras principais é interessantíssimo, com um destaque para a relação entre Vladislav e o(a) eterno(a) inimigo(a) que lhe persegue, A Besta.
Por um lado, o filme perde por não dar voz ou qualquer forma de distinção ao operador de câmera. E pelo outro, isto já quebra alguns paradigmas do gênero. Mas retornando ao primeiro lado, talvez Stu pudesse ter sido o cameraman. Talvez não. Para ser honesto, as situações e intrigas do argumento de Clement e Waititi compensa por quase tudo. Vários momentos espetaculares existem nele, como a reconstituição dramática do que aconteceu com Stu após ser atacado pelos lobisomens – que não arranca menos do que uma gargalhada – ou a cena pós-créditos, em que Deacon hipnotiza o espectador e obriga-o a esquecer todo o filme.
O visual é simplório, mas sofisticado, contraditoriamente. Os efeitos convencem não só por casar com o estilo humorístico, mas por serem também puramente bons. A cena em que Deacon e Nick lutam no teto de cabeças para baixo é muito mais interessante do que a sequência em que Gordon Levitt faz o mesmo em A Origem – dirigido pelo “brilhante” Christopher Nolan e com um orçamento milionário –.
Assim como Nick vomita sangue quando experimenta batatas fritas após a sua transformação, o filme vomita personalidade, e uma bastante jovial. A dinâmica faz dele um verdadeiro The Office com vampiros – contando, inclusive, com cenas em que os personagens, decepcionados, olham diretamente para a câmera –, mas permite que ainda encontre a sua própria identidade. A fórmula é típica: aquela velha brincadeira com personagens anacrônicos e com o absurdo – como quando uma dupla de policiais é hipnotizada e a coisa mais estranha que encontra no lar dos vampiros é a ausência de alarmes de incêndio, quando um deles está voando diante deles –.
O Que Fazemos Nas Sombras é engraçado, original e se aproveita do que há de melhor no cinema independente: o frescor.