Os 10 Melhores Títulos da Marvel NOW
Com a inédita saga (risos) Guerras Secretas chegando, o fim do Universo Marvel como o conhecemos se torna mais provável a cada dia. Sim, após dúzias de arcos construídos a partir da mesma promessa (incluindo a iniciativa Marvel NOW), talvez finalmente vejamos alguma mudança drástica no palco mitológico da editora. A iniciativa NOW fechou todos os arcos abertos e trouxe edições #1 para todos os seus heróis, não num reboot total, mas na apresentação de uma linha cronológica mais aberta para novos leitores. E agora que estamos diante de, muito possivelmente, um reboot completo, que melhor oportunidade para falar sobre os melhores quadrinhos da Marvel NOW do que esta?
Vamos lá.
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Se havia uma tarefa que a NOW estava obrigada a cumprir com as suas novas séries, era a de repaginar o que antes não se encaixava. As peças estragadas do puzzle, do tipo que não combina com as outras de jeito nenhum. E o Cavaleiro da Lua sempre foi uma dessas peças. Embora o arquétipo de um super-herói mentalmente perturbado seja, de fato, sedutor, Spector nunca foi mais do que uma miscelânea de ideias sem harmonia. Não é preciso cavar muito para desenterrar a verdade: pouco mais do que a resposta da Marvel ao Homem-Morcego da concorrência (ele literalmente tem batarangs no formato de luas). Mas Warren Ellis, de alguns dos melhores argumentos que passaram pela revista, soube adicionar um ingrediente secreto à receita (leia-se: bizarrices). A tonalidade neo-noir, magnificamente ilustrada por Declan Shalvey, envolve e o Mr. Knight é fascinante. O folclore pessoal do personagem é desnecessariamente complicado e bobo e conforme as edições passam, tendem a ficar mais fracas, mas ainda vale a pena por algumas boas sacadas e pela arte.
A Viúva Negra nunca esteve entre as minhas personagens prediletas (e isso vem de um apaixonado pelo Raio Negro e Homem-Formiga). Em parte, porque o próprio arquétipo da ex-assassina não me agrada (todo o conceito de femme fatale estrangeira é um pouco ultrapassado), mas ainda mais porque ela nunca teve arcos solo memoráveis. Porém, seria impossível para mim ir contra o toque artesanal que Edmondson dá às histórias, que parecem ser tiradas de um filme de espionagem ou de uma franquia stealth. E a personagem, numa revista character-driven em que não a sua presença não é discrepante em relação ao próprio mundo e heróis que a cercam, se desenvolve bem. E com os desenhos atrevidos de Noto, torna-se ainda mais impossível para mim conseguir fugir do título. De muito, muito bom gosto.
Seguindo o admirável movimento de destaque feminino que deu graça às revistas da NOW, Soule conquistou território com a sua (injustiçada) Mulher-Hulk. O traço de Pulido não é fácil. Muitos sentem repulsa por cada milímetro desenhado pelo artista, mas para ser sincero, eu nunca me incomodei. A heroína verde está mais amável do que nunca, as histórias não aspiram ser nada mais do que divertidas e se a HQ se aquece sob a mesma fogueira alternativa que Gavião Arqueiro e outras boas histórias do selo. Entretenimento limpo e amigável.
Kamala Khan incorpora o que houve de melhor nos últimos anos da Marvel. Ela é moderna, espirituosa, alegre e socialmente consciente e a suas histórias também. O roteiro é soft e recebe novos leitores de braços abertos, enquanto o traço e as cores são sempre de bom gosto - e se encaixam no núcleo cultural da garota -. Pode parecer estranho dizer algo do gênero tão cedo, mas a heroína é o novo Peter Parker (a nova ponte entre o leitor e os quadrinhos) e uma das personagens originais mais bacanas que a Casa das Ideias inventou nos últimos sei-lá quantos anos. E o melhor de tudo é que ela ganhou os seus poderes com a bomba de p de Raio Negro e Maximus, o que contribuiu para a popularidade dos Inumanos (que eu, pessoalmente, sempre adorei). Bom para quem tem preguiça de sentar no sofá para assistir um filme de aventura com um balde de pipocas e quer ter a mesma experiência virando as páginas de um quadrinho.
Há muito o deus nórdico tem servido somente como coadjuvante em grandes sagas, e descontente com esta circunstância, Aaron decidiu escrever novas histórias - ou melhor, mitos - em que o filho de Odin poderia mostrar a sua grandeza. E ele conseguiu! No seu run pelo mundo de Thor, Aaron escreveu verdadeiras lendas, episódios que realmente poderiam se passar por capítulos de uma edda. E o traço que possibilitou que a escala épica que ele queria dar fosse um sucesso foi o de Ribic. A revista traz tudo que você pode ou deve esperar de uma história do Thor: batalhas memoráveis, tavernas imundas, monstros ferozes, deuses pomposos, cenários deslumbrantes e linguagem de época. Simplesmente excepcional.
Como o artigo inteiro está servindo para evidenciar, considero fantástica a premissa de arrancar completamente um personagem da sua zona de conforto e obrigá-lo a descobrir e adaptar-se a uma nova, porque o leitor é capaz de acompanhar todo o processo. Então, o que Slott e Allred fizeram ao agarrar num ser que no seu core é poeticamente triste como o Surfista e colocá-lo em aventuras à lá Doctor Who não poderia ser mais interessante do que já é. A dupla forma um casamento de mentes absolutamente simétrico, ideias que não poderiam ser melhor escritas ou desenhadas (hoje, se o Allred estiver desenhando, eu leio). Ótimos personagens (Dawn é um encanto) para uma ótima HQ.
Dentre as muitas qualidades que faltam no mercado editorial quadrinístico, a que mais me tem chamado atenção é a de self-awareness. O saber reconhecer as condições naturais de algo. Personagens vazios ou que já renderam o que tinham a render que viram alvo de exploitation porque vendem bem (vide o estúpido Deadpool e o saturado Batman, respectivamente) e ótimos personagens que não são trabalhados de modo algum (ninguém lembra do Questão?) definem a indústria. Mas, de vez em quando, alguém aceita que uma ideia é virtualmente ridícula e decide revisitá-la de uma maneira mais informal, e é isso que Spencer e Lieber fazem com essa série. Os inimigos mais patetas do Aranha em quadros engraçadíssimos, inspirados e despretensiosos que exploram soberbamente o universo aracnídeo. Do tipo 'uma comédia e um heist film entram num bar'. Self-aware.
A escrita de Fraction é nostálgica, um culto às histórias de pura imaginação que fizeram os quadrinhos e o Quarteto nascerem. O autor sabe instrumentar aventuras mágicas e engraçadas com um toque delicado que desperta afeição (os sonhos de Lang fazem o leitor sentir a sua perda). Não gosto de algumas particularidades da arte de Allred (não funciona muito bem para retratar conceitos mais realísticos), mas o desenhista é uma boa pedida para dar rosto ao mundo de estranhezas que o seu parceiro traz e, como já disse, me tornei um fã. Os quatro personagens são adoráveis (Marvel, me dê mais Scott Lang e Darla Deering!) e a conclusão que recebem é tocante e completa. O grupo mais divertido dos últimos tempos vai fazer falta. Minha favorita da lista.
Você quer um bom drinque de criatividade? Aqui estão dois. Quadrinhos mainstream celebrando o advento do mercado indie (assim como muitas outras revistas aqui listadas). Fraction é, sem qualquer contra na balança, um dos roteiristas mais ousados de hoje. Se você, como eu, está cansado de ver sequências de ação nonstop, Aja põe nas suas mãos uma edição inteira construída a partir do ponto de vista do cachorro do Gavião Arqueiro. É sobre personagens, diálogos e risadas. Sobre as inusitadas ocasiões que podem resultar da soma do extraordinário com o mundano. Sobre o que distingue a Marvel das concorrentes. Se você estava procurando uma amostra de genuína liberdade criativa, pode parar de procurar.
Murdock sempre foi um personagem interessantíssimo, mas o herói nunca teve um status quo constante na editora. Num momento as suas histórias eram legais e no outro chatas. Quando Mark Waid começou a escrever sobre o Homem sem Medo, ele mostrou porque o Demolidor é tão fascinante e como reduzi-lo ao ‘cara triste que protege uma cidadezinha claustrofóbica e melancólica’ é burrice (aprende, DC!). E quando quer fazer drama, sabe fazer drama. O que Waid fez com o herói foi tão simples e ao mesmo tempo tão brilhante que é difícil não se sentir surpreendido lendo a revista. Aqui, o leitor é introduzido a um Matt Murdock que é, talvez, uma das figuras mais complexas dos quadrinhos atuais. O traço é sempre muito bonito, seja o de Rivera, seja o de Samnee ou qualquer outro artista que já tenha se aliado a Waid (todos sabem ilustrar com excelência a cegueira do herói). Fico feliz por ver Matt Murdock tentando ser feliz. Uma lição de como se fazer histórias em quadrinhos.
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Bom, é isso.
Pessoalmente, eu adorei a iniciativa Marvel NOW enquanto durou. Foi uma estratégia criativa muito mais inteligente do que um reboot per se e eu gostaria que a Marvel prosseguisse por esse caminho, mas parece que não é o que vai acontecer. Tivemos algumas péssimas histórias (como Vingadores e tudo girando em torno de Infinito) e algumas incríveis histórias (Novos Vingadores é uma delícia de se ler), como sempre acontece nos quadrinhos.
De qualquer modo, espero que ao contrário d’ Os Novos 52 (onde tudo acontece pelo espetáculo gráfico da troca de sopapos), a Marvel com o seu reboot consiga atualizar os seus personagens sem distorcer os seus espíritos. Eu não quero daqui a algum tempo sentir falta do Homem-Aranha como sinto do Superman.
E você? Quais foram os seus títulos preferidos da Marvel NOW?